Falaremos de um tema delicado e muito contemporâneo:
violência policial. Sendo assim, tentaremos entender porque este tipo de
comportamento parece tão frequente nesta classe profissional.
Desde de junho de 2013, temos acompanhado o aumento de protestos nas ruas. São diversas camadas sociais, vinculadas a diferentes ideologias políticas com diferentes demandas. Porém, na maioria delas, houve uso exagerado de força e violência para conter os manifestantes, que por vezes incluía idosos, crianças e adolescentes.
Seria cômodo apelarmos para explicações mentalistas como "falta de consciência" ou
"personalidade autoritária". No entanto, estas explicações apenas
rotulam os comportamentos dos policiais, mas não explicam como o comportamento
violento foi modelado e possíveis contingências mantenedoras.
Primeiro, é preciso compreender que o profissional da
policia é treinado em técnicas de combate e autodefesa (por meio de modelagem e modelação). O objetivo é que ele saiba lidar com situações extremas
de perigo e emergência (estimulação
aversiva), o que requer este tipo de repertório que podemos chamar de "mais
bruto". O principal estímulo ao qual os profissionais são treinados a
fazer uso da força são outros seres humanos, por motivos óbvios: são outros
seres humanos que cometem crimes e se comportam de maneira violenta nas
cidades. Então, todo e qualquer outro ser humano que não esteja fazendo uso da
farda da corporação pode ser indicado como estímulo
aversivo condicionado. Seres humanos podem se tornar estímulos aversivos
condicionados por meio de pareamentos diversos a contextos aversivos (perigo) e
por meio de equivalência de estímulos
seja pelo tipo de vestimenta ou bairro, seja por meio de comportamentos verbais
de topografias "ladrão", "arruaceiro",
"baderneiro", etc.
Podemos exemplificar isso por meio da tríplice contingência
também:
1. Contexto:
alguém grita "pega ladrão" (estímulo aversivo condicionado);
2. Comportamento:
correr, alcançar e conter o sujeito; e
3. Consequência:
prender o suspeito (reforçamento negativo).
Como sabemos, o reforçamento tem como um dos seus subprodutos a estereotipia da resposta, ou seja, aquela topografia que tem maiores densidades de reforço tornam-se mais prováveis de repetir. Assim, podemos supor que no dia a dia os profissionais da policia fazem maior uso de abordagens mais agressivas devido o principal perfil de ocorrência: furtos e assassinatos. Como sabemos, nossos comportamentos podem ser generalizados para outros contextos. Agora, imaginemos o seguinte: do ponto de vista do policial, tentar conter um número muito maior de pessoas pode funcionar como um estímulo aversivo de altíssima magnitude. Isso explica porque o nível de truculência. Bom, e como sabemos, estimulação aversiva cria contexto pra comportamentos de fuga/esquiva, no caso, o comportamento dos manifestantes.
Porém, é importante frisar que, quando explicamos a
truculência policial não estamos justificando moralmente. É importante deixar
claro que uma explicação comportamental não é uma justificativa legal/moral, é
apenas a avaliação de variáveis em um dado contexto!
Continuando, é importante lembrarmos que há condições
fisiológicas que se tornam operações
estabelecedoras para alguns comportamentos. Por exemplo, privação de sono,
falta de descanso (fadiga) e privação alimentar possibilitam que o organismo
emita mais comportamentos agressivos. É de conhecimento popular que
profissionais da policia fazem rondas em lugares perigosos e, por vezes, seu
turno de trabalho é o noturno. Quando o principal turno do policial é o
noturno, outras condições aversivas podem ser instaladas, como privação de contato social com família,
amigos e conjugues. Ou seja, há todo um contexto que produzem condição para
maior emissão de comportamento agressivos e estereotipados (truculência).
Voltando às explicações mentalistas "falta de
consciência" e "personalidade autoritária". No primeiro caso,
podemos defender que sobre estimulação
aversiva é muito mais complicado de fazermos decisões autocontroladas (como diminuir nível de violência). Neste
caso, temos dois comportamentos concorrendo: se comportar de modo agressivo e
se comportar de maneira mais contida. Pela série de condições que indicamos
anteriormente, fica claro que se comportar de maneira violenta se torna mais
provável. Além de que, dentro de contextos específicos, o uso da violência
excessiva pode ocorrer sem que haja condições punitivas previstas. Por exemplo,
quando um governador deseja dispersar uma manifestação que é contrária a seus
interesses particulares e solicita a corporação policial que use de todos os
meios disponíveis de contenção (ou seja, não
há punições previstas para comportamentos autoritários/truculentos).
No caso da personalidade
autoritária, ela não tem valor causal ou de controle comportamental. No
entanto, podemos classificar o repertório comportamental de alguma pessoal de
diversas formas. Mas esta classificação apenas diz respeito a frequência com que o comportamento
ocorre ou probabilidade de ocorrer.
Por exemplo, quando falamos que alguém é tímido indica apenas que uma pessoa se
esquiva de chamar atenção e que é pouco provável que ela se exponha a condições
em que ela será o centro das atenções. Neste caso, talvez até seja interessante
discutir o que seria uma personalidade autoritária na visão
analítico-comportamental...
Como sabemos, alguns comportamentos são generalizáveis para diversos contextos. Em alguns casos, o
comportamento agressivo é generalizado para relações interpessoais íntimas,
como ambiente familiar. Nestas situações, torna-se muito provável que situações
de violência doméstica contra a
mulher ocorram. Neste caso, além do que já foi exposto há as condições sociais
patriarcais as quais estamos todos expostos e ainda não foram mudadas, em que
nos é ensinado padrões de comportamento como homem-bruto e mulher-submissa.
Inclusive, não é incomum que os profissionais psicólogos que trabalham em
corporações policiais tenham que atender mulheres vítimas de violência
doméstica.
Clique na imagem pra saber mais sobre uma experiência de Polícia Comunitária em Santos |
Finalizando, compreender o comportamento de profissionais militares e policiais é uma excelente ferramenta para poder propor trabalhos de humanização e controle de impulsividade. É previsto por lei que nas corporações policiais tenha um psicólogo de formação atuando. Sendo assim, é desejável que nos apropriemos do tema e intervenhamos.
Acima um exemplo de ação humanitária: policial colombiana salvou vida de uma criança abandonada ao amamentá-la e, segundo os médicos, se ela não tivesse sido nutrida, provavelmente teria ido a óbito.
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