terça-feira, 17 de junho de 2014

Movimentos de Greves como modelo ilustrativo do conceito de Metacontingência


Todos devem ter ouvido ou vivido a situação de greve dos metroviários de São Paulo. Nada mais justo utilizarmos este fato recente como pano de fundo para explicação do conceito de Metacontingência.
Sigrid Glenn foi a primeira analista do comportamento a se utilizar o termo Metacontingência como modelo de compreensão da seleção comportamental no terceiro nível, ou seja Práticas Culturais, no seu artigo "Metacontingência em Walden II", em 1986. Desde então, ela vem refinando este conceito a partir de pesquisas básicas.

A Metacontingência seria a unidade de análise das Práticas Culturais, equivalente ao papel que a Contingência desempenha como unidade de análise dos comportamentos individuais nas contingências de reforço. 

Uma Metacontingência, porém, não diz respeito a um conjunto de indivíduos se comportamento ao mesmo tempo. Metacontingência diz respeito a comportamentos entre indivíduos que se inter-relacionam, em uma interdependência, gerando uma consequência que só seja possível por meio da ação de mais de um individuo, apenas. Por exemplo: apresentação de uma orquestra sinfônica ou organização e realização de uma festa comemorativa.


Para que um conjunto de contingências individuais seja consideradas uma Metacontingência, é preciso que: (a) haja um Entrelaçamento de Contingências (normalmente ocorre por meio de regras pre-estabelecidas) e (b) produção de um Produto Agregado, que seja possível apenas quando mais de um sujeito se comportam.

O Entrelaçamento de Contingências é quando há uma ligação entre as ações de determinados indivíduos e outros, por exemplo, relações econômicas. Destas relações interdependente, teremos um Produto Agregado sendo produzido, por exemplo, geração de emprego e renda (ou, caso o entrelaçamento de contingências não seja favorável, crises financeiras e estagnação econômica).

Ok, mas e as Greves?


Para que uma Greve ocorra, notadamente, tem que haver uma organização formal sobre quando começa e que reivindicações serão pauta de luta. Assim, ocorrem várias reuniões de classe profissionais e junto ao seu respectivo Sindicato. Dito de outro modo, é preciso que haja um Entrelaçamento de Contingências (reuniões e levantamento de pautas) e a produção de um ou mais Produtos Agregados (como reivindicações serem cumpridas).

Algo singular nas contingências envolvendo as Greves é que realmente todos os profissionais devem paralisar suas atividades laborais, do contrário a Greve vai perdendo seu poder de barganha. Ou seja, o Produto Agregado vai perdendo o poder de controlar os possíveis comportamentos dos patrões relacionados as reivindicações (ceder as pressões e colaborar com as pautas reivindicadas).

Outro ponto importante, as Greves são mais efetivas quando elas influenciam não só no comportamento do patrões, mas de outras pessoas (os consumidores, ou seja os Agentes Receptores). Agentes Receptores são outros sujeitos que usufruem diretamente do Produto Agregado, mas não são as próprias pessoas que a produziram. Por exemplo: o agente receptor de uma festa micareta são os consumidores, mas um churrasco de fim de semana em família é a própria família o agente receptor.


Voltando com um exemplo, greves entre os setores de transporte coletivo ganham grande visibilidade e se fortalecem constantemente porque atingem uma parcela muito grande da população (Agente Receptor). Esta, normalmente, deseja apenas que a Greve termine, independe dos seus resultados. Desta maneira, a população pressiona os Governantes (Agências de Controle) a mediarem o conflito entre Patrões e Colaboradores... Como os patrões são reconhecidos como indivíduos com poder superior (logo desigual) frente aos funcionários, é comum que as principais pautas reivindicadas sejam resolvidas favoravelmente aos colaboradores.

É importante deixar claro que a própria realização da Greve, de modo pleno, é um importante meio de barganha política com empregadores. Outro ponto importante, Greve é uma forma de Contracontrole coercitivo, normalmente, usando em ultima instância, quando outros meios de diálogo não geraram frutos.

Contracontrole? Não, apenas não estou afim de ser controlado coercitivamente...

Um ponto importante: a Agência de Controle Governo criou condições jurídicas para que os profissionais que organizem as Greves não sejam punidos injustamente. Por exemplo, os funcionários grevistas não poderão sofrer represália por parte dos patrões (como demissões), desde que a Greve cumpra as normas de uma Greve Lícita. Ou seja, é preciso que os sujeitos que farão o Contracontrole tenham um mínimo de Autocontrole e só deflagrem Greve após se comportarem de acordo com as Regas pré-estabelecidas pela Agência Controladora Governo, por meio jurídico. 

Por este motivo, a tentativa de represália (as demissões de funcionários) por parte dos Senhores Metroviários foi reconhecida como ilegitima e nenhum dos grevistas sera deposto de seu cargo.


Enfim, como podemos perceber, há um grupo extenso de entrelaçamentos de contingências que interdependem entre si. Tornando a análise da Greve como base e compreendendo que ela é mais fácil de analisar, posto que há regras normativas pré-estabelecidas, outras Práticas Culturais, com menor influência de Agências de Controle ou Produtos Agregados diversos ou mesmo desconhecidos, tornam as análises em nível cultural mais complicadas... Porém, não impossíveis!

Bom, este foi nosso exemplo ilustrativo. Espero que tenha ficado claro, apesar de saber que em alguns pontos eu deva ter complicado mais do que esclarecido. Por este motivo, fica a indicação do texto de Marcio Borges Moreira "Introdução ao Estudo de Metacontingências".

P.S.: Como muitos pesquisadores nacionais e internacionais têm desenvolvido pesquisas básicas sobre o conceito de Metacontingência, pode ser que este já tenha sido reformulado. Caso encontremos literaturas que comprovem que houveram algumas alterações, retomaremos o tema para falar mais um pouco sobre o desenvolvimento do conceito de Metacontingência.

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