domingo, 24 de dezembro de 2017

Análise Aplicada do Comportamento: entre o entusiasmo e frustração

Existe uma aposta entusiasmada entre os analistas do comportamento que é: podemos produzir mudanças no mundo. Que mudanças são estas e que limites impostos pelo mundo, não sabemos. Convido os leitores a nos questionarmos um pouco sobre nossa cumplicidade frente a afirmação acima.


Quando somos jovens estudiosos e interessados no que diz respeito às psicologias, tendemos a diminuir os questionamentos e aceitar de modo fácil algumas afirmações em torno de que nos for dito. Uma possível análise funcional simplista para esta fase de enamoramento é que a maioria dos comportamentos relacionados ao curso de psicologia são reforçadores e eliciam respondentes emocionais de prazer. Sendo assim, relatos de felicidade e concordância se tornam mais frequentes de que relatos de desaprovação ou questionamentos.

Deste modo, quando criamos maiores afinidades com determinada vertente política ou abordagem de psicologia, tendemos a ser mais concordantes com comportamentos verbais similares a nossa comunidade verbal do que de outras comunidade, principalmente se a comunidade outra destoar nos fundamentos epistemológicos. Então, passamos a nos comportar de acordo com os critérios de reforçamento da comunidade que temos afinidade do que de outras e passamos a consequenciar o comportamento de terceiros de acordo com este critérios.

Voltando ao ponto inicial: somos muito entusiasmado com afirmativas de que “onde houver um organismo se comportando, há condições de intervir como analista do comportamento” ou “identificando as condições mantenedoras de comportamento, é possível modificá-lo”. Nossos comportamentos de repetir e concordar com estas frases foram reforçados de modo que dificilmente nos questionamos sobre. Estas frases não são de todo erradas, mas são imprecisas.

Não é porque podemos intervir no comportamento de inúmeros organismos que haverá fontes de financiamento do nosso trabalho. Não é porque compreendemos as condições mantenedoras que temos ferramentas suficientes para modificar as condições históricas e físicas que controlam o comportamento. Foquemos na segunda assertiva, já que a primeira fica claro que há questões políticas amplas que tornam intervenções comportamentais mais ou menos desejáveis para gestores do que outras.


Um jovem de bairro periférico, nascido e crescido em um ambiente em que não há relato de alguém que tenha se formado em um curso superior ou assuma cargo de prestígio social. Não há capilaridade das políticas sociais de cultura e lazer. Não há uma comunidade que modela, reforçar e mantêm comportamentos pró-sociais, no qual as figuras de poder e respeito são envolvidos com a criminalidade. É pouco provável que nossas intervenções sejam tão eficientes quanto desejamos.

Há regras quanto aos locais que este sujeito possa alcançar, tornando-se operações abolidoras para comportamento de se engajar em mudanças. Mesmo que o sujeito se engaje em mudanças, há um custo de resposta alto e atrasado em demasia. Tratando-se de uma comunidade que não modela comportamentos pró-sociais, é possível que este sujeito não tenha desenvolvido comportamentos tidos como auto-controle. Sendo a criminalidade uma alternativa viável para a comunidade verbal, cujos ganhos são de baixo custo, normalmente imediatos e de alta magnitude, há condições limitadíssimas para que um analista do comportamento intervenha de modo efetivo (segundo os critérios socialmente desejáveis).


Isso não quer dizer que não tenhamos condições de modificar alguns comportamentos. Isso não quer dizer que não tenhamos algumas iniciativas maravilhosas e interessantes de intervenção social, inclusive quanto a criminalidade e violência. Mas, significa que temos que reconhecer os limites da intervenção comportamental. Por exemplo, ninguém lembra de informar aos recém-formados que nossas intervenções são um recorte muito pequeno na história de reforço de determinado comportamento. Que um comportamento foi reforçado durante anos e que, em determinado momento, tornou-se um problema. Que levará tempos até que a magnitude dos reforços que mantinham o comportamento se esvaneçam ou que consigamos criar novos reforçadores naturais (dificilmente há esta opção).

Outro ponto que deve ser assinalado é que tratar comportamentos de criminalidade como alvo de intervenção são desejáveis, mas, por vezes, se trabalharmos em dispositivos de saúde e sociais, haverá sujeitos que não tem interesse em mudar estas condições de vida. Isso não quer dizer que não haja outros comportamentos a serem tratados. No entanto, ao chegarmos em diversos destes dispositivos, há uma pressão social de que corrijamos determinados comportamentos e, por vezes, estas não serão as demandas da comunidade assistida. A disparidade entre o que as agências de controle (universidade e gestores) sinalizam como problema a ser resolvido e as dificuldades impostas pelo campo (recursos institucionais escassos, precarização das instituições públicas, comunidade que demanda outras intervenções ou sujeitos que não se engajam para este objetivos externos) podem eliciar respostas classificadas como frustração. Tal contexto pode estar relacionado com extinção de comportamentos que classificarei como profissionalmente engajado.


Sendo assim, calma. Não podemos mudar todos os comportamentos. Há condições históricas e físicas que limitam nossa intervenção. Somos uma variável nova na vida de muitas pessoas e que dispõe de reforçadores limitados e de baixa magnitude para modelar os comportamentos. Há pressões políticas e institucionais para que foquemos em determinados comportamentos e não para outros, mas nem sempre estes critérios são adequados para se intervir com comunidades. Nem todas mudanças são imediatas ou o comportamento final será o desejado (aquele que nossa comunidade nos reforçou a esperar). Temos muito o que explorar e intervir antes de dizer que possamos mudar o mundo. Temos que ter caltela.

Enquanto não podermos afirmar com seguranças que podemos mudar o mundo, continuemos tentando e agregando pares que nutrem o mesmo objetivo político!

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